Um processo não é feito só de papel e palavras. No que se refere a papel o processo judicial eletrônico está aí para quebrar conceitos e instituir novas práticas.
Quantos às palavras, elas são instrumentos de exteriorização do nosso pensamento. Seu uso pode ser discreto e objetivo ou prolixo e inútil.
O texto das leis enquadra-se na objetividade e pode ser interpretado tanto para o bem como para o mal.
Recentemente tive prova dessa afirmação. O TRT 2 firmou convênio para facilitar o protesto de dívidas não pagas em processo judicial.
Em processo sob meus cuidados requeri este procedimento junto a uma das varas do trabalho da capital de São Paulo.
O MM. Juiz Federal houve por bem rejeitar o pedido alegando que o processo era anterior ao convênio e que o protesto não era um direito da parte mas uma faculdade do juiz.
Abaixo reproduzo o Agravo de Petição tirado em processo sumaríssimo.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 71ª VARA DO TRABALHO DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO – SP.
PROCESSO: 00000-0000-071-02-009.
*************************, já qualificada nos autos do processo em epígrafe que move em face de COLÉGIO FAUSTO CAMUNHA LTDA, com fundamento no artigo 897 da Consolidação das Leis do Trabalho vem, respeitosamente, interpor recurso de
AGRAVO DE PETIÇÃO
A Agravante não se conforma com a decisão de V. Exa. que indeferiu o pedido de emissão de certidão de crédito trabalhista bem como seu protesto junto ao Distribuidor do Serviço Central de Protesto de Títulos de São Paulo (SCPT), pelos motivos de fato e de direito que passa a expor nas razões anexas, requerendo ao final o quanto segue.
Ante o exposto, requer seja o presente recurso enviado ao Egrégio Tribunal Regional do Trabalho.
São Paulo, 13 de setembro de 2012.
SAMUEL PAULINO
OAB/SP 140.476
PROCESSO: 00000-0000-071-02-009.
ORIGEM: 71ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO
AGRAVANTE: **************
AGRAVADO: COLÉGIO FAUSTO CAMUNHA LTDA.
EGRÉGIO TRIBUNAL
Eminentes Julgadores
A Agravante requer assistência judiciária gratuita, para o fim de processamento deste recurso.
O despacho contrariado é terminativo em relação ao pedido que o ensejou.
FATOS:
Na execução que *****************, move a COLÉGIO FAUSTO CAMUNHA LTDA desde dois mil e três (2003) a Reclamante não logrou até a presente data receber seus créditos, hoje avaliados em R$ $$.$00,00 ($ mil e $ reais).
Solicitou ao MM. Juiz Federal do Trabalho, com fundamento no provimento, que fosse expedida certidão para inscrição e protesto da dívida.
O pedido tem fundamento na Consolidação das Normas da Corregedoria Regional (Provimento GP/CR nº 13/2006), Capítulo XIII, Seção XXIII).
Malgrado a fundamentação, sobreveio o despacho agravado, adiante reproduzido, dando por fim à prestação jurisdicional pleiteada.
“Vistos, etc.
Não há como acolher o pedido de protesto feito pelo reclamante às fls. 262, uma vez que não é cabível para execuções pretéritas, ou seja, anteriores à regulamentação do Provimento GP/CR 02/2010 do E. T.R.T. 2ª Região, ademais, Vislumbra-se nos presentes autos que os requisitos da Lei nº 9.492/1997 não foram atendidos.
Ressalte-se, ainda, que a efetivação do protesto é uma faculdade do Juízo, o qual não se justifica no caso em tela.
Indique o reclamante, em 30 dias, meios para o prosseguimento da execução.
No silêncio, ao Arquivo Geral.
Determino o registro dos devedores
executados no BNDT.
Intime-se.
Em, data supra.
Jorge Eduardo Assad
Juiz do Trabalho”
INCONFORMISMO:
Acredita a Agravante ser do interesse do judiciário perseguir todos os meios possíveis para efetivar a execução, fechando em definitivo mais um processo, ao invés de simplesmente remetê-lo a arquivo, salvaguardando mais os interesses da Agravada que do trabalhador.
Presume a Agravante que a decisão agravada deveria ter fundamento legal irretorquível.
Porém, Na análise do mérito da decisão agravada não logrou a parte requerente encontrar no texto normativo fundamento que impeça a aplicabilidade da norma a execuções anteriores à sua expedição.
Assim, não havendo norma expressa proibitiva, merece incidir no caso em testilha regra segundo a qual as normas processuais novas se aplicam de imediato aos casos em andamento, segundo o estado processual em que se encontram.
O esgotamento da fase executória somente se dá com a prescrição ou com o pagamento, espontâneo ou coercitivo.
No caso em tela não se verifica a ocorrência de qualquer dos fenômenos acima apontados, logo, é plenamente possível a incidência das normas que norteiam o protesto de dívida trabalhista vencida.
A Consolidação das Leis do Trabalho no artigo 912 estabelece regra segundo a qual:
Art. 912 – “Os dispositivos de caráter imperativo terão aplicação imediata às relações iniciadas, mas não consumadas, antes da vigência desta Consolidação”.
Mostra o artigo reproduzido que a tese da aplicabilidade imediata tem fundamento no âmbito trabalhista, mas não bastando este, pode-se ainda recorrer à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei nº 4.657).
Em seu artigo primeiro a norma determina “Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada”.
Que argumentos se levantarão contra a aplicação das normas em discussão? Que as normas da corregedoria e o provimento não são leis?
De certo não o são no sentido estrito da palavra, não provêm de órgão legislativo, mas estão inseridas em um arcabouço legislativo, segundo uma organização hierárquica.
Portanto, subsumem-se às normas que lhe são superiores, não podendo se furtar na sua aplicabilidade à coerência com aquelas.
No entendimento da Agravante e salvo melhor juízo, a legação de que não houve cumprimento dos requisitos da lei 9.492/1997 não convencem por si só, persistindo o inconformismo.
A lei 9.492/97 possui quarenta e três artigos, e foi alterada em duas oportunidades pela MPV 1894-22/99 e pela Lei 9.841/99.
A norma em referência “Define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras providências”, portanto, ao concluir “que os requisitos da Lei nº 9.492/1997 não foram atendidos” fala de forma genérica, impossibilitando averiguação e eventual correção.
Em meio a quarenta e três artigos, de uma lei que não tem um tópico, seja livro, capítulo, seção, subseção que trate especificamente de requisitos para protesto de dívida trabalhista, é impossível saber a que exatamente o despacho agravado se refere.
Induz a acreditar que o despacho hostilizado foi engendrado para dificultar, impossibilitar, fechar mesmo as portas à prestação jurisdicional plena.
Esta interpretação canhestra não merece prevalecer, pois desdoura a função social da Justiça do Trabalho e do ideal de justiça que deve por ela ser perseguido.
Ademais, a decisão guerreada, no ponto em que remete a requisitos incertos da lei 9.492/97 não atende ao princípio da fundamentação das decisões.
Quanto à sua estrutura o despacho é satisfatório, mas no mérito, melhor, quanto à inteligência do ato, carece de motivação.
Carece de motivação porque a lei apontada não traz em seu texto, requisito que não tenha sido atendido nos autos e que seja impeditivo da concessão do quanto requerido a fim de efetivar a execução.
Ademais, no despacho não houve indicação de quais seriam, na visão do magistrado, os requisitos não atendido, impossibilitando assim a verificação da sua pertinência ou eventual incorreção.
Também impossibilita a adequação do processo ao passo que entende o juízo como condição “sine qua non” para a concessão do pedido.
A declaração de ser “faculdade do juízo” também merece analisada de forma isenta e criteriosa.
O processo, seja ele de conhecimento ou de execução, não existe para ser laboratório de teses doutrinárias, em qualquer das suas modalidades tem fim específico, qual seja, a satisfação de um interesse legítimo, seja fixando-o seja praticando atos que levem a realização concreta do direito reconhecido.
Assim, o juiz não é imbuído, seja pela lei, seja pelo provimento, de poder discricionário, não está livre para fazer o que quer, simplesmente porque assim o quer, antes, encontra limites na lei, na doutrina e na jurisprudência.
Discricionariedade plena leva a tribunais de exceção.
Na esteira deste pensamento a faculdade do juízo não elide o fundamento, se não há fundado motivo para negar, a decisão não se sustenta.
Necessita de fundamentação específica e concreta. A fundamentação genérica “...requisitos da lei...” não é suficiente para dar ao despacho agravado a necessária legalidade a justificar a resolução e determinação da vontade de negar a prestação requerida.
Não se nega por negar, por não gostar do advogado, por achar que o processo é velho, por achar que não dará resultado.
Negação por negação, enseja toda espécie de desconfiança, trata-se de birra ou de perseguição? Poderia ser falta de critério. Sendo este o entendimento, cabe a esta E. Corte de Justiça estabelecê-los já no julgamento deste recurso, para evitar, quanto possível a subida de outros agravos pelo mesmo motivo.
O argumento de que se trata de “faculdade do juiz” pode até ser verdadeiro, mas não é socialmente útil, justo ou razoável.
O processo trabalhista tem um fim social que deixa de ser atendido com a decisão Agravada.
Na relação trabalhista a Obreira-Agravante é a parte mais fraca, tecnicamente, hipossuficiente, em relação à Empresa-Agravada, portanto, é injusta na sua essência.
A falta de motivação específica para a decisão tomada a torna não-razoável, refletindo discricionariedade extrema injustificada. Há na decisão enfrentada desperdício que merece evitado.
Uma vez iniciado o trabalho da execução, essa fase deve percorrer todo o seu iter sob pena de desperdício de todo o tempo e investimento empregado até então. Seja do advogado, seja do judiciário através da estrutura que mantém para exercer o seu papel social.
Assim, para que se evite o desperdício dos insumos e até recursos, inclusive humanos, merece prevalecer a tese de que não há óbice ao deferimento do protesto perseguido pela Agravante.
O pedido de expedição e protesto de certidão da dívida encontra suporte ainda no convênio que o Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região celebrou com o Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil – Seção de São Paulo e os Dez Tabeliães de Protesto da Capital.
Argumenta-se ainda que não há impedimento legal para a prática solicitada ao MM. Juiz de primeiro grau.
Argumenta-se que há norma interna prevendo a possibilidade da prestação jurisdicional nos limites pleiteados.
Há acordo que concretiza a execução da norma interna e permite a satisfação plena do quanto pleiteado.
Faltou apenas a vontade do magistrado de primeira instância, que não encontrando argumento suficiente para afastar o pedido, indicou fundamento genérico, completo na forma, mas vazio no conteúdo.
Assim, a vontade judicial pode e merece suprida por esta superior instância como medida de lídima justiça.
Requer a V. Exas. se dignem conhecer do recurso e no mérito dar-lhe provimento para o fim de determinar a expedição de certidão da dívida, bem como o referido protesto, nos termos das normas, provimentos e convênio pertinentes.
Termos em que,
Pede deferimento.
São Paulo, 13 de setembro de 2012.
SAMUEL PAULINO
OAB/SP 140.476
ACÓRDÃO:
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO
PROCESSO TRT/SP N.º 0210900-58.2003.5.02.0071
AGRAVO DE PETIÇÃO EM RITO SUMARÍSSIMO DA 71a VT DE SÃO PAULO
AGRAVANTE: ***********************************
AGRAVADOS: 1. COLÉGIO FAUSTO CAMUNHA LTDA
2. JOSÉ ROSALINO
Dispensado o relatório, nos termos dos artigos 852-I e 895, § 1º, IV, da CLT, com redação dada pela Lei nº 9.957/2000.
VOTO
1- DO CONHECIMENTO
Conheço do recurso interposto, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade.
2- DO DIREITO
A exequente insurge-se contra a decisão que indeferiu a expedição de certidão de protesto, nos moldes do Provimento GP/CR 02/2010, nos seguintes termos: “Não há como acolher o pedido de protesto feito pelo reclamante às fls. 262, uma vez que não é cabível para execuções pretéritas, ou seja, anteriores à regulamentação do Provimento GP/CR 02/2010 do E. TRT 2ª Região, ademais, vislumbra-se nos presentes autos que os requisitos da Lei nº 9.492/97 não foram atendidos. Ressalta-se, ainda, que a efetivação do protesto é uma faculdade do Juízo, o qual não se justifica no caso em tela. Indique o reclamante, em 30 dias, meios para o prosseguimento da execução. No silêncio, ao Arquivo Geral”.
Cumpre-me, antes de adentrar no mérito do recurso, expor que a presente execução assim caminhou, em síntese: homologação de cálculos em 22/07/2004 (fl. 115); mandado de citação, penhora e avaliação com penhora positiva (fl. 123); auto negativo de praça (fl. 128); Bacen-Jud negativo (fl. 131); mandado de citação, penhora e avaliação na pessoa da sócia Márcia Regina Rosalino, com penhora positiva de onze berços (fl. 139); auto de arrematação dos onze berços, cada um avaliado em R$ 380,00, pelo valor total de R$ 200,00 (fl. 149); Bacen-Jud negativo (fl. 162); auto de penhora de bens móveis às fls. 171/173; diligência do SDJ negativa (fls. 176/177); certidão negativa de penhora sobre veículo (fl. 198); certidão negativa do Detran (fl. 243); ofício da DRF (fl. 255); Pesquisa Arisp negativa (fl. 257).
Do acompanhamento feito no parágrafo anterior, concluo que as possibilidades de se garantir a execução estão esgotadas. Não se justificam, data vênia, os argumentos do MM. Juízo a quo no sentido de que não se atendem os requisitos legais para a efetivação de protesto ou de que o procedimento não se justificaria no caso em tela. Isto porque se trata de providência derradeira, a ser tomada quando não mais se vislumbrem Documento elaborado e assinado em meio digital. Validade legal nos termos da Lei n. 11.419/2006.
possibilidades concretas de se garantir o crédito trabalhista. É o que ocorre no caso em tela, como já se asseverou. Por outro lado, também não merece prosperar o fundamento de que as normas trazidas pelo Provimento GP/CR 02/2010 não se aplicam a execuções pretéritas.
Trata-se de matéria afeta à aplicação da lei processual no tempo. A regra geral no sistema processual pátrio é a de aplicação imediata da nova norma processual (tempus regit actum). Ou seja, com sua entrada em vigor, produz efeitos imediatos, aplicando-se aos processos que se iniciarão posteriormente. Não atinge, entretanto, os processos findos, pois, quanto a estes, deve-se respeitar o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (artigos 6º da LICC e 5º, XXXVI, da CF/88).
Para os processos em curso, como é o caso dos autos, aplicase o sistema do isolamento dos atos, segundo o qual a nova lei não se aplica aos atos já realizados, devendo, entretanto, ser aplicada aos atos a praticar.
Este é o entendimento dos artigos 912 da CLT e 1.211 do CPC, os quais transcrevo, in verbis:
Art. 912 - Os dispositivos de caráter imperativo terão aplicação imediata às relações iniciadas, mas não consumadas, antes da vigência desta Consolidação.
Art. 1.211. Este Código regerá o processo civil em todo o território brasileiro. Ao entrar em vigor, suas disposições aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes.
(Sem grifos no original)
Outro não poderia ser o entendimento advindo do Provimento GP/CR 02/2010, que, apesar de não se tratar de genuína regra processual, investe-se deste caráter, na medida em que propicia ao credor mais uma forma de persecução de seus direitos. Não poderiam ficar alheias ao convênio firmado por este E. TRT as execuções que durante maior tempo se prolongam sem solução. É justamente a elas que se destinam as disposições em comento.
Assim, dou provimento ao agravo de petição interposto, para determinar a expedição de certidão de protesto, nos moldes do Provimento GP/CR 02/2010.
ACORDAM os Magistrados da 12ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em: conhecer do agravo de petição interposto pela exequente e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar a expedição de certidão de protesto, nos moldes do Provimento GP/CR 02/2010, nos termos da fundamentação.
Des. Benedito Valentini
Relator